Inevitável e indispensável

Prezado político, com sua licença, vou brincar de profeta – mas o assunto é sério. Consulte no dicionário as definições – ou definição plena – de política e descubra que todo ser humano faz política. Por isso, ao iniciar dizendo prezado político, dirijo-me também a você. Outubro está aí e as eleições não nos reservarão muitas surpresas, se é que alguma significativa haverá.

Nem todos que estiveram, estão ou estarão, se eleitos ou reeleitos, são preguiçosos, ineptos e corruptos. Mas, como a lombriga que parasita o nosso organismo, debilitando-o, furtando-o e vivendo com regalo às nossas custas, o mal e mau político – com mandato, indicado ou comissionado – faz um estrago enorme e só será útil quando retirado de cena. Vivemos a eleger gente que parecia a vitamina de que precisávamos e revelou-se nada mais que outra lombriga. Se eleitos, tomam posse das boas obras e ações dos antecessores, dão-lhes outros nomes e divulgam como se seus mentores fossem; para seus erros e omissões encontram culpados nos antecessores e opositores. Ou, o que havia de bom no governo anterior, é cancelado ou debilitado. Da conjuntura surgida à revelia do detentor de mandato, o que puder ser-lhe favorável será apresentado com alarde e como se fosse o ou um dos responsáveis. Promessas e discursos são cuidadosamente ajustados à época, lugar, público e circunstância. Alguns entraram ou entrarão para a história com imerecida fama de íntegros e úteis. E quando Deus, cada vez mais, num oportunismo altamente questionável, vira cabo eleitoral pela boca de candidatos fiéis religiosos mais de ocasião do que por convicção, o eleitor realmente íntegro e interessado no bem comum precisa esforçar-se para mais acertar que errar quando votar; e acompanhar, ajudar e cobrar do eleito atitudes compatíveis com seu discurso durante a campanha.

Especialistas dizem que nossa democracia é criança: eleições e governos se sucederão entre erros e acertos, lentamente tornando-a mais justa, na amplitude do termo. Nossa Constituição é exemplo: enorme, inchada. Nações mais antigas e evoluídas possuem constituições mínimas e suficientes: cidadãos são bem conscientes e praticantes dos seus direitos e obrigações individuais e coletivas.

A podridão é atual e histórica: gente se elege falando em fazer política para todos e faz politicagem para si e seus parentes e amigos. Porém, aquela compreensão usual de que povo é vítima e político é bandido, não é correta. Político ou politiqueiro veio do povo – mesmo se nascido em berço de ouro ou tendo conseguido um. Muitas vezes, se tivéssemos ocasião, faríamos exatamente aquilo que condenamos no outro. E para ser politiqueiro não é preciso ser político partidário: sindicalistas, síndicos, diretores de associações, líderes religiosos, líderes estudantis, vizinhos, torcedores, famílias etc., são sujeitos a sucumbir diante das armadilhas das atividades das quais participem. Ante as tentações do sexo, do poder e do dinheiro, aliadas às dificuldades inerentes a quaisquer relacionamentos, toda pessoa pode oscilar entre ser vítima ou vilã.

Política é tão inevitável quanto indispensável. Do seu significado, a parte que, bem exercida, viabiliza todas as suas variáveis é: “habilidade no trato das relações humanas, com vista à obtenção dos resultados desejados; civilidade, cortesia.” A depuração do mundo político partidário é diretamente proporcional à velocidade e intensidade com as quais mais pessoas fazem no seu cotidiano aquilo que esperam e exigem que seus representantes façam, uma vez eleitos, indicados e pagos para isso.

José Carlos de Oliveira

Publicado originalmente em 24 de setembro de 2006

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