O grão e a espiga

Durante o processo seletivo e no momento em que foi aprovada para o emprego ela sabia e aceitou que seria registrada.

            Serviço iniciado, patrões querendo cumprir a obrigação de registrá-la, na forma da lei; ela, negando receber seu direito. Motivo? Continuar recebendo o seguro desemprego. Resultado: foi dispensada por causa da sua falta de ética, para não chamar de mentirosa, desonesta.

            Seguro desemprego existe para apoiar a pessoa durante a procura por nova colocação. Objetivo alcançado, com o registro cancela-se o recebimento do seguro.

            Muita gente compactua com transformar o período do recebimento do seguro desemprego em férias: se o fizer com ordem e método, incluindo se aperfeiçoar, quem sou eu para dizer que é errado?

            Muita gente compactua com o jeitinho de transformar o período do recebimento do seguro em férias, sem ordem e sem método, na preguiça, sem nenhuma ou significativa atitude para aperfeiçoar-se, dependendo além do razoável do dinheiro de si e de parentes e amigos, criando o risco de dar desgosto e calotes neles e nas contas a vencer. Se, mais por acaso que por fruto de atitude concreta, lhes surgir oportunidade de emprego, negará ou aceitará somente se receber o salário mais o seguro desemprego. Tem quem consiga, não é legal e tem cumplicidade de uns patrões, geralmente, compelidos a fazê-lo, sob riscos, para economizar ou evitar onerar seus negócios: faz-se o acordo e torce-se para que não surjam ‘contratempos’.

            Muita gente se agarra ao grão de milho e perde a espiga. O grão da espiga de milho é ou são uns poucos meses de ‘férias’, ‘salário’ ou seguro, num, quanta vez, evitável, período de desocupação. A espiga é a oportunidade de um emprego efetivo, duradouro e satisfatório que, por vezes, exige que você desista do grãozinho inicial. O emprego, como nossos pais aprenderam e vivenciaram e muitas vezes esperam para nós e para nossos filhos está em baixa, mudando e é processo crescente, mundial e irreversível, por razões boas e ruins. Quem ainda pretende ter um, à moda antiga, e que valha a pena, precisa se desenvolver e se destacar e aprender a tomar cuidado para não desperdiçar boas oportunidades, abdicando da possibilidade de dar certo, em favor da certeza efêmera e relativa que dá aquele grãozinho de milho…

Escrevi e publiquei este artigo originalmente em 5 de junho de 2006.

            Quase duas décadas depois e centenas de interações com candidatos a empregos, desde a triagem de currículos, pré-entrevistas, entrevistas, dinâmicas de grupo, provas situacionais, treinamentos, conversas e nas horas anteriores ou iniciais do primeiro ou suposto primeiro dia de trabalho, esse ‘amor incondicional’ a um enganoso e deletério ‘grão de milho’ permanece comum e vitorioso na sua capacidade de gerar derrotados, figurantes ou, no máximo, pessoas absolutamente iguais a quaisquer outras, geralmente, com mais mediocridade que notabilidade. 

            Esse e outros equívocos enraizados e disseminados também por porção de mentores, formadores, pregadores e influenciadores digitais, dentre outros agentes, contribuem com quem? Com aqueles que aprendem que a vontade, o estudo e o esforço devem identificar e focar a ‘espiga’ e não o ‘grão’: nos sentimentos, pensamentos, atitudes, hábitos, relacionamentos e objetivos pessoais e profissionais, de si e dos outros; pois, é assim que enfrentam menor concorrência, menos procuram e mais são procurados pelas melhores oportunidades, e as geram também. 

            O sal que tempera e dá sabor e qualidade às ‘espigas’ é a ética: muita gente pensa ou encena possuir, tendo-a nenhuma, pouca ou seletiva, ficando mais na retórica e propaganda enganosa; pouca gente a assimila como valor fundamental a potencializar qualificações e adequações reais e diferenciadas, e oportunidades até para ganhar dinheiro, além dos bens mais importantes que ele. Ética é polêmica, mas, é consistente!

            Entre as pessoas de boa vontade ninguém está impedido de se flagrar equivocado e iniciar as tentativas concretas de correções e evoluções: logo e cada vez mais aprenderá que no mundo corporativo e na vida, para as melhores oportunidades e relacionamentos, nada é mais diferenciado e inovador do que parar de ser só mais um grão e figurante e edificar-se e evoluir para ser espiga e protagonista!…

            Publicado originalmente em 5 de junho de 2006 e complementado em 15 de julho de 2022

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